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24 de dezembro de 2015

Análise de um tema de redação 2016


Hoje a coluna de Redação  analisa a proposta de redação do vestibular 2016 da UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo – do Sistema Misto de Ingresso. O tema da proposta deste ano foi, no mínimo, surpreendente, já que se trata de uma polêmica, na nossa opinião: A adoção da pena de morte pode contribuir para a redução do número de crimes hediondos no Brasil?
Do modo como está escrito, o tema da proposta de redação da UNIFESP 2016 relaciona a pena de morte com os crimes hediondos, isto é, crimes que são considerados de extrema gravidade, como por exemplo, homicídios, homicídios qualificados, latrocínios (roubos seguidos de morte), lesões corporais gravíssimas ou seguidas de morte, sequestros, estupros, estupros de vulnerável, genocídios etc. Portanto, o candidato deveria, obrigatoriamente, tecer ligações entre a pena de morte e uma possível diminuição dos crimes hediondos no país e argumentar se acredita ou não nesta relação direta.
A proposta de redação da UNIFESP 2016 conta com três textos na coletânea textual. O primeiro texto é uma adaptação de uma matéria jornalística do jornal Folha de São Paulo de maio deste ano que informa, no contexto das mortes de dois brasileiros na Indonésia, em 2015, acusados de tráfico internacional de drogas, que a última pena de morte aplicada no Brasil foi em 1861 e que este tipo de pena foi abolido no país com a proclamação da República, em 1889 mas, infelizmente, ocorreu ao longo da ditadura militar e hoje é previsto apenas em situação de guerra.
segundo texto da coletânea, por sua vez, é uma adaptação de um trecho do livro Cidade de Muros, de Teresa Caldeira. Nele, a autora informa que a pena de morte voltou a ser debatida no fim da década de 1980 com a redemocratização do país e por causa do aumento da violência policial (que continua militar, apesar de não vivermos mais, felizmente, sob um Estado ditatorial militar) e dos crimes violentos. De acordo com Caldeira, a pena de morte é frequentemente relacionada aos crimes hediondos e ela ainda os define, ótimo para o candidato que não conhece a definição deste tipo de crime.
A autora afirma que a pena capital reflete, segundo seus apoiadores, o “sentimento popular” de justiça que, para ela, na verdade, é mais uma vingança do que justiça. O texto ainda traz o dado de que, no fim da década de 1990, pesquisas indicavam que 70% da população era a favor da pena de morte e hoje a porcentagem de pessoas favoráveis à pena capital é de 43%. Para os políticos daquela época que a defendiam, como os criminosos que cometem crimes hediondos não podem ser recuperados, já que são “dominados pelo mal”, a pena de morte seria o único modo de evitar que eles voltem a praticar esse tipo de crime e nem tanto intimidar futuros crimes.
Já o terceiro texto fonte, de Julita Lemgruber, apresenta três dados sobre a pena de morte oriundos dos Estados Unidos e Canadá. Segundo a autora, nos Estados Unidos, onde a pena de morte foi reintroduzida em 1976, a taxa de homicídios por cem mil habitantes é de duas a quatro vezes maior à registrada em países que não aplicam tal punição, como os da Europa Ocidental. Nos estados norte-americanos que não preveem a pena capital, de acordo com o texto, a taxa de homicídios é menor do que nos estados nos quais há a previsão da pena de morte e, no Canadá, em 1975, um ano antes da extinção da pena capital, a taxa de homicídios era de 3,09 por cem mil habitantes e em 1993 era de 2,19, ou seja, 27% menor.
Para Lemgruber, a relação entre pena de morte e controle de criminalidade é posta de maneira irresponsável no Brasil, como se fosse a única e “mágica” solução para todos os problemas relativos à segurança. Segundo a autora, isso não passa de demagogia.
Os textos da coletânea textual, sobretudo o segundo e o terceiro, tendem a levar o candidato a questionar a eficácia da pena de morte posta a fim de diminuir os crimes hediondos, já que criticam os argumentos favoráveis baseados na “vontade popular” e trazem dados contrários a esta relação. Porém, acreditamos que nada impede a argumentação favorável à pena de morte pelo candidato que assim pensa.

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