NO INICIO DO BLOG

23 de janeiro de 2010

Leiam...lembrem que a leitura os ajudará ............

Admiro, gosto, são sensacionais os textos de David Coimbra, Zero Hora, 22/01/2010, por isto estou postando mais um, com a esperança de que vocês irão ler.....
SEGUNDA CLASSE
A solidariedade é um sentimento de segunda classe. Num mundo ideal, a solidariedade seria sempre subalterna ao que realmente importa: a justiça.
A justiça.
É quase um deboche: tudo de sublime que o homem faz na vida o faz à procura da Justiça no mundo, e a justiça no mundo não existe.
Todos os filósofos, Sócrates, Espinosa, Kant, Shopenhauer, Freud, todos eles, só o que fizeram foi trabalhar para descobrir como funciona a Justiça no mundo. Construíram cadetrais de pensamento, e por meio delas explicaram o movimento das engrenagens de algo que é só ficção.
Um deles, Schopenhauer, alcançou a verdade: concluiu que o mundo é injusto. E é.
A religião resolveu a questão. Admite que durante a vida não há Justiça e promete que ela será feita depois da morte. Uma saída genial, poque ninguém até hoje conseguiu cobrar o não cumprimento da promessa, embora também seja verdade que ninguém o confirmou.
O Schopenhauer das religiões é o budismo. Na sua essência, o budismo é realisticamente pessimista, conforma-se com o vazio e com a inação. Talvez esteja certo.
De qualquer forma, tanto o budismo quanto Schopenhauer tentam achar algum conforto na reflexão, e, ora, conforto não há.
A literatura também. Toda a literatura se estrutura na ideia ilógica de que a Justiça existe. Até atividades mais superficiais do intelecto humano, como o jornalismo e o direito, só que o fazem é a busca pela Justiça.
Um drama eterno da Civilização. É insolúvel. Porque o homem tenta - organiza-se em sociedades, formula leis, constrói filosofias, tem fé em deuses, conta a sua própria história, tece fabulações e poemas, monta sistemas de pensamento, o homem passa a sua existência neste Vale de Lágrimas acreditando que caminha na direção da Justiça, e então ocorre um cataclisma como o do Haiti, e pessoas morrem aos milhares e as que sobrevivem são mutiladas e crianças tornam-se órfãs sem que para isso haja qualquer motivo. Há quem diga que seja a reação da Natureza vilipediada pelo homem. Bobagem. Há 250 anos a Revolução Industrial nem havia começado e Lisboa foi destruída por um terremoto não muito diferente do que assolou Porto Príncipe. Tragédias naturais acontecem desde sempre sem necessidade da ajuda do homem.
Tanta gente morta, tanta gente viva que sofre, e tudo sem razão. Porque não há razão. Não há Justiça no mundo. O que sobra? Está aí: a solidariedade.
A solidariedade, como o pensamento dos filósofos, a fé das religiões e as leis do Direito, a solidariedade é um consolo. Hoje, o mundo inteiro se move pela dor do Haiti. Não é um solução, talvez seja bem pouco, quase nada, mas num mundo sem Justiça, é o que há.

Nenhum comentário: