O Conceito de Crase
No estudo da gramática da Língua Portuguesa, o fenômeno da subordinação sintática entre palavras dentro de uma estrutura (um sintagma, uma frase etc.), fazendo com que algumas palavras complementem o sentido de outras, é denominado regência. Assim, uma palavra que não tem o sentido completo (termo regente) é complementada por outra ( termo regido). Vejamos, como exemplo, a expressão:
Comprei um livro ontem.
Em tal estrutura linguística, temos o verbo comprar sendo complementado por um livro. Nota-se que não há a necessidade de preposição para ligarmos o verbo ao seu complemento, o objeto direto, um livro, pois é assim que ficou acertado o uso de tal verbo em nossa a língua. O sentido soaria “ruidoso” e seria gramaticalmente incorreto se disséssemos comprei A (ou PARA etc) um livro ontem, pois tal verbo, no sentido de adquirir, é transitivo direto e não pede preposição.
Alguns verbos, por outro lado, pedem obrigatoriamente preposição para se ligarem aos seus complementos. Vejamos:
Refiro-me a/o funcionário do atendimento.
Neste caso, o verbo referir-se pede a preposição A e soaria “ruidoso” dizer refiro-me o funcionário. Podemos notar que, além disso, após a preposição A ocorre o artigo O, pois o complemento funcionário pede tal artigo, inclusive quando o colocarmos como sujeito de uma frase: O funcionário do atendimento está atento. O artigo aqui é obrigatório. (Vale dizer que nem sempre tal teste funciona).
Pois bem!!! Quando temos um verbo que pede obrigatoriamente a preposição A seguido de uma palavra que pede um artigo feminino A ocorre então o fenômeno da crase. Os gramáticos – vale dizer – sentiram a necessidade de normatizar tal fusão dos AS porque soaria estranho pronunciar ou escrever dois AS seguidos, o que, aliás, também ocorreria com os pronomes demonstrativos AQUELA (S), AQUELE (S), AQUILO. Deste modo, resolveram adotar o sinal grave (`)na grafia da crase dos AS.
Esta camiseta é igual à (àquela) que compraste e o cinto é semelhante àquele.
Elas deveriam comparecer ao (àquele) evento.
5.2 A Análise Sintática e a Crase
Embora seja uma questão fonética, é a partir da análise da sintaxe dos termos das orações que decidimos sobre a adoção ou não da crase em nossa escrita. Para que usemos com acerto a crase, temos sempre que analisar duas questões:
a) temos que verificar a regência do verbo, se ele pede ou não a preposição A, e isto só pode ser feito com a consulta constante a dicionários, ou com a memorização das regências;
b) temos que verificar se o termo que serve de complemento ao verbo pede artigo feminino A ou se se trata do A de Aquela(s), Aqueles, etc.
Somente tal análise sintática nos dará certeza sobre a crase.
Vamos analisar alguns casos para compreender isto.
Caso 1
1. Ele se referia(às) irmãs de Paula.
Digamos que o estudante saiba que o verbo referir-se pede preposição, porém tem dúvida quanto ao uso do artigo no complemento irmãs de Paula. Sendo assim, é possível tirar a dúvida transformando a expressão que serve de complemento do verbo por outra semelhante no masculino: aos irmãos de Paula. Ora, se ocorre no masculino a prep. A, unida ao artigo OS , a fusão também ocorrerá com o feminino: ela se referia A + AS irmãs de Paula. Isto indica a presença da crase na frase.
Digamos que tenhamos dúvida sobre o verbo e a preposição. Vejamos os seguintes casos.
Caso 2
2. A aluna se dirigiu( à) sala de aula e depois se dirigiu (a) casa.
Nestes casos, podemos usar um outro expediente: transformar a suposta preposição A em uma preposição semelhante: PARA. Teremos então: a aluna se dirigiu para a sala: a aluna se dirigiu para casa. Temos então crase no primeiro caso e no segundo não.
No segundo exemplo, não há crase porque a palavra casa, no sentido de lar, domicílio por convenção, não recebe artigo. Todavia, ao determinarmos a palavra casa ela receberá o artigo. Vejamos:
A casa de Deus é sagrada. A casa paterna é calorosa. A casa 31 é azul.
A aluna dirigiu-se à casa paterna…de Deus… à casa 31.
Caso 3
Há casos em que a crase é facultativa porque o complemento verbal não pede obrigatoriamente artigo.
Referiu-se (à) minha irmã e depois referiu-se (à) Paula.
Nestes casos, podemos fazer um teste, colocando o complemento do verbo como sujeito de uma oração, com tal tentativa, poderemos notar se o uso do artigo é facultativo:
Sua irmã é ótima pessoa. A sua irmã é ótima.
Paula é boa pessoa. A Paula é boa.
Ora, se o artigo é facultativo, também a crase é facultativa, sendo que tais expressões, sem a crase, ficam apenas com o A preposicional.
Portanto, a crase é facultativa em dois casos:
a) Antes de nomes femininos, pois em nossa língua estes nomes não exigem obrigatoriamente o artigo, a não ser quando são determinados por uma outra expressão.
(A) Cleonice recebeu uma carta.
Enviamos uma carta /à/ Cleonice .
A (artigo obrigatório) Cleonice da Faculdade (determinação) recebeu uma carta.
Enviamos uma carta à Cleonice da Faculdade.
b) Antes de pronomes possessivos adjetivos femininos singular.
(A) Minha irmã pediu explicações.
Pediram explicações /à/ minha irmã.
Observação: quando o pronome possessivo tem a função de um substantivo, o uso da crase ou é obrigatório ou proibido. Veja:
A minha faculdade é melhor que a tua(=faculdade).
O meu time é melhor que o teu(time).
Esta estátua é semelhante à nossa.(nossa).
Este Rodin é semelhante ao nosso.(Rodin).
Nestes casos, os pronomes estão sendo usados para substituir substantivos( que estão entre parênteses) e não para acompanhar um substantivo dando-lhe uma qualidade, como ocorre em minha irmã.
No primeiro exemplo, o uso da crase é proibido porque não há preposição, apenas ocorre o artigo. Isto fica evidenciado quando transformamos a expressão em outra semelhante no masculino(segundo exemplo).
No terceiro exemplo, é obrigatório o exemplo da preposição e do artigo.
Caso 4
Algumas expressões têm termos elididos, mas mesmo assim ocorre a crase.
-Aquela garota é interessante.
– Qual?
– Refiro-me à (garota)que está de azul.
5.3 Casos Especiais
1. Nomes de localidades. Há os que pedem artigo antes de si e os que não admitem a presença do artigo. Se comprovarmos que o verbo pede preposição, basta testar se o topônimo pede artigo e para isto podemos mudar o verbo da oração por ESTAR ou VIR.
O time foi a Porto Alegre. O time veio de Porto Alegre…estava em Porto Alegre.
Os professores foram à Europa. Os professores vieram de + A Europa. Os professores estavam EM+A Europa.
2. Para saber se há crase com os demonstrativos iniciados em A, basta substituir os mesmos pelos demonstrativos Este, Isto, Esta, se antes deste tivermos preposição, então teremos a crase.
Enviei cartas àquela empresa ( a esta).
A crítica está relacionada àqueles problemas. ( a estes).
A solução era aquela apresentada ontem (esta).
3. Quando a expressão casa significa lar, domicílio e não vem acompanhada de adjetivo ou locução adjetiva não há crase: chegamos a casa cedo. Chegamos à casa paterna tarde.
4. Não há crase quando a palavra terra significa algo oposto a mar, ar, bordo. Todavia, quando terra significa o planeta, lugar onde se nasceu, solo onde se planta, então pede artigo e se houver verbo com preposição haverá crase.
Voltei à terra onde nasci.
Os Ets chegaram à Terra.
Os lavradores se dedicaram à terra durante toda a vida.
Os marinheiros resolveram ir a terra.
5. Não se usa a crase na locução a distância, significando de longe. Ali ocorre apenas a preposição A. Quando tal termo é determinado, então ele pede artigo.
A distância de 65 km é percorrida em poucos minutos e Petrópolis fica à distância de 65 km do Rio.
Ele me olhava a distância.
6. Para sabermos se existe ou não crase diante de um pronome relativo, temos que, em primeiro lugar, encontrar o seu antecedente e, logo após, substituí-lo por um substantivo masculino. Se o A se transformar em AO, evidencia-se a crase; caso isto não ocorra, e o A fique inalterado ou se transforme em O, então não ocorre crase.
A faculdade a que me refiro precisa de professores.
O colégio a que me refiro precisa de professores.
A avenida em que moro é paralela Àque vai dar na praça.
O parque em que moro é paralelo AO que vai dar na praça.
Com isto testamos se o antecedente pede ou não o artigo feminino.
Obs.: o pronome relativo não pode ser substituído por outro semelhante.
7. Não confunda DEVIDO com DADO.
Conforme Houaiss, devido é:
1. “ adjetivo e substantivo masculino – que ou o que é objeto de uma dívida ou de uma obrigação. Exs.: recebeu-a com a d. consideração, mandou pagar o d. “
2. substantivo masculino – que ou o que é merecido, justo, o que cabe a cada indivíduo por direito ou dever.”
3. (Houaiss, ver verbete)
Portanto devido pede a preposição, assim há crase em frases como : “devido à bagunça dos vizinhos, não dormi” (devido AO barulho).
Já dado , significando “habituado ou propenso a.
Exs.: d. ao estudo; d. à bebida”, podemos ter sucesso ou não. Neste caso, devido é um adjetivo que pede a preposição A.
Todavia, dado pode ser também o particípio de dar, significando algo que já foi exposto, revelado.
Ex.: dada a questão primordial, dado o problema (com base em tal questão já exposta) envolvendo tais fatos, chegamos à conclusão que não iremos negociar.
5.4 Casos em que crase é obrigatória
1. Locuções prepositivas, adverbiais e conjuntivas (desde que, no último caos, tenham um substantivo feminino como núcleo).
À moda de, às vezes, à queima-roupa, , às escuras, à noite, à custa de, às pressas, à tarde, à medida que, à força.
2. Em locuções adverbiais que indiquem hora determinada.
Às treze horas em ponto.
3. Quando as expressões “rua”, “loja” estiverem subentendidas.
Vá à Casas Bahia, vá à (loja) Lojas Americanas, Dirija-se à Marquês de São Vicente, n º 155.
Nos dois primeiros exemplos, a questão é polêmica, mas se advogarmos que há o termo loja elidido, então os exemplos estão corretos.
5.5 Casos em que não ocorre crase
1. Antes de palavra masculina ( o A é apenas preposição): Vieram a pé, vende-se a prazo; chegou a tempo.
2. Antes de verbo (o a é apenas preposição): Ela começou a admirá-los; ela começou a passar mal.
3. Antes de expressão de tratamento (o A é apenas preposição) : Agradeço a Vossa Senhoria ; ofereceram rosas a você.
4. Antes de pronomes demonstrativos esta ,essa. ( o A é apenas preposição): Não me refiro a esta solicitação; A essa menina não devo nada.
5. Antes de pronomes pessoais ( o A é apenas preposição): Dirigiu-se a mim com respeito e a ela com gratidão.
6. Antes de pronomes indefinidos ( o A é apenas preposição): ela diz isso a qualquer um; a entrada é vedada a toda pessoa estranha, a toda a Bahia ele deve dinheiro.
7. Quando o A estiver no singular e a palavra seguinte estiver no plural (( o A é apenas preposição): refiro-me a pessoas curiosas, falei a mulheres sobre mulheres.
8. Quando antes do A já existir uma preposição (o A é apenas artigo): os papéis estão sob a mesa; ela falou aquilo perante a coordenação.
Observação: Martins e Zilberknop observam que ATÉ A pode ser craseado por motivo de clareza, fugindo à regra acima. Vejamos os exemplos:
A água inundou a rua até à casa de Maria.
A água inundou a rua até a casa de Maria.
No primeiro caso, significa que a água quase chegou à casa de Maria, no segundo, significa que a água inundou inclusive a casa de Maria.
Quando ATÉ significa “perto de” “limite”, ATé é uma preposição que admite uma outra preposição para auxiliá-la é o caso do primeiro exemplo.
Quando até significa “inclusive” , é um advérbio e o A é uma partícula de inclusão.
Veja, para confirmar, em Houaiss o verbete ATÉ:
“Preposição
1 expressa um limite posterior de tempo. Ex.: ficará a. maio
2 expressa um limite espacial, o término de uma distância ou de uma superfície Exs.: trace uma linha a. o canto. venha a. aqui.”
Advérbio
3 também, inclusive, mesmo, ainda. Ex.: come a. carne crua .
4 no máximo. Ex.: ponha a. cinco folhas para ferver .
“a) como prep., é indiferentemente correto associá-la ou não a outra preposição (ir a. o parque ou ir a. ao parque; caminhar a. a igreja ou a. à igreja), embora, por vezes, se imponha tal escolha para evitar a ambiguidade: em frases do tipo estudei a. a quinta lição e percorremos até o campo, em que tanto se poderia entender ‘até mesmo a lição ou o campo’ ou ‘até o limite da lição ou do campo’; atualmente, as utilizações oscilam; b) como prep. us. com pron. pessoal oblíquo tônico (ela chegou a. mim e me abraçou); como adv. us. com pron. pessoal reto (a. eu paguei o imposto); c) como prep. o lugar dele é fixo, antes do nome ou sintagma nominal a que se refere; como adv., sua posição pode variar na frase: saiu numa escola de samba, a.” (Houaiss, ver verbete).
5.6 Exercício. Nas orações abaixo, coloque crase, se necessário.
1. Antes de ir ao teatro, a mãe sempre agradava a filha passando a mão nos cabelos.
2. As declarações do ministro não agradaram a bancada do governo.
3. Ela aspirou a fragrância do alecrim.
4. O menino aspirava a carreia de piloto.
5. O médico assistiu a moça doente.
6. Quando ela telefonou, estávamos assistindo a peça.
7. O Ministro da Educação atendeu a reinvindicação que constava no processo pelos docentes.
8. As recepcionistas atendiam as convidadas com carinho.
9. Garçom! Quero a tulipa bem cheia.
10. Queria-lhe mais que a própria vida!
11. Custa muito as pessoas ficarem quietas.
12. Esta portaria do governo implicará a reavaliação dos nossos gastos.
13. O menino desobedeceu a mãe, mas a mãe obedeceu a lei.
14. Prefiro a morte a vida de solteiro.
15. Pisei a grama
16. Pisei a ponta do pé dela.
17. Abraçou-se com o pai, chorou; abraçou a irmã e foi embora.
18. Ela lembrou as férias com saudade.
19. Após presidir a sessão, o desembargador presidiu uma mesa redonda.
20. Avisei a turma que iria chegar tarde.
21. Ensinei-o a dança do ventre.
22. Agradeci a equipe a vitória.
23. Comunicou a decisão a outro, mas não a mim.
24. Comunicou a amiga a cerimônia de casamento.
25. Pagamos a empresa a conta devida.
26. Jesus perdoou a traição , perdoou a Madalena.
27. Autorizou a professora a dispensar os alunos.
28. Convidei-o a ficar no local
5.6 Exercício. Nas orações abaixo, coloque crase, se necessário. (Respostas)
1. Antes de ir ao teatro, a mãe sempre agradava a filha passando a mão nos cabelos.
No sentido de acarinhar pede OD.
2. As declarações do ministro não agradaram a bancada do governo.
Agradável pede A
3. Ela aspirou a fragrância do alecrim.
Respirar pede OD
4. O menino aspirava a carreia de piloto.
No sentido de pretender, pede A
5. O médico assistiu a moça doente.
Pede OD ou OI
6. Quando ela telefonou, estávamos assistindo a peça.
Ver pede A
7. O Ministro da educação atendeu a reinvidicação que constava no processo . pelos docentes.
Deferir pede OD, mas no sentido de dar atenção pede LHE.
8. As recepcionista atendiam as convidadas com carinho.
Atenção com pessoas pede OI ou OD.
9. Garçon! Quero a tulipa bem cheia.
Desejar pede OD
10. Queria-lhe mais que a própria vida!
Estimar pede A
11. Custa muito as pessoas ficarem quietas.
Ser difícil pede A
12. Esta portaria do governo implicará a reavaliação dos nossos gastos.
Trazer como consequência pede A, não pede Em
13. O menino desobedeceu a mãe, mas a mãe obedeceu a lei.
Pede A
14. Prefiro a morte a vida de solteiro.
À vida. Incorreto: do que a vida…
15. Pisei a grama
Pede OD e não NA
16. Pisei a ponta do pé dela.
Idem
17. Abraçou-se com o pai, chorou; abraçou a irmã e foi embora.
Quando pronominal, pede COM, Pede OD ou OI , crase facultativa.
18. Ela lembrou as férias com saudade.
Correto ou DAS férias.
19. Após presidir a sessão, o desembargador presidiu uma mesa redonda.
Pede OD ou OI, crase facultativa.
20. Avisei a turma que iria chegar tarde.
Pede OD OI.
21. Ensinei-o a dança do ventre.
Correto, mas pode ser com LHE.
22. Agradeci a equipe a vitória.
Agradecer a alguém alguma coisa.
23. Comunicou a decisão a outro, mas não amim.
Pronome indefinido e pron. Pessoal não pedem artigo.
24. Comunicou a amiga a cerimônia de casamento.
Comunicar algo a alguém.
25. Pagamos a empresa a conta devida.
Pagamos alguma coisa a alguém.
26. Jesus perdoou a traição , perdoou a Madalena.
Perdoar pede OD ou OI. Para pessoa e OD para coisa.
27. Autorizou a professora a dispensar os alunos.
Autorizar alguém a fazer algo.
28. Convidei-o a ficar no local
Convidar alguém a algo.
5. CRASE
5.1 O Conceito de Crase
No estudo da gramática da Língua Portuguesa, o fenômeno da subordinação sintática entre palavras dentro de uma estrutura (um sintagma, uma frase etc.), fazendo com que algumas palavras complementem o sentido de outras, é denominado regência. Assim, uma palavra que não tem o sentido completo (termo regente) é complementada por outra ( termo regido). Vejamos, como exemplo, a expressão:
Comprei um livro ontem.
Em tal estrutura linguística, temos o verbo comprar sendo complementado por um livro. Nota-se que não há a necessidade de preposição para ligarmos o verbo ao seu complemento, o objeto direto, um livro, pois é assim que ficou acertado o uso de tal verbo em nossa a língua. O sentido soaria “ruidoso” e seria gramaticalmente incorreto se disséssemos comprei A (ou PARA etc) um livro ontem, pois tal verbo, no sentido de adquirir, é transitivo direto e não pede preposição.
Alguns verbos, por outro lado, pedem obrigatoriamente preposição para se ligarem aos seus complementos. Vejamos:
Refiro-me a/o funcionário do atendimento.
Neste caso, o verbo referir-se pede a preposição A e soaria “ruidoso” dizer refiro-me o funcionário. Podemos notar que, além disso, após a preposição A ocorre o artigo O, pois o complemento funcionário pede tal artigo, inclusive quando o colocarmos como sujeito de uma frase: O funcionário do atendimento está atento. O artigo aqui é obrigatório. (Vale dizer que nem sempre tal teste funciona).
Pois bem!!! Quando temos um verbo que pede obrigatoriamente a preposição A seguido de uma palavra que pede um artigo feminino A ocorre então o fenômeno da crase. Os gramáticos – vale dizer – sentiram a necessidade de normatizar tal fusão dos AS porque soaria estranho pronunciar ou escrever dois AS seguidos, o que, aliás, também ocorreria com os pronomes demonstrativos AQUELA (S), AQUELE (S), AQUILO. Deste modo, resolveram adotar o sinal grave (`)na grafia da crase dos AS.
Esta camiseta é igual à (àquela) que compraste e o cinto é semelhante àquele.
Elas deveriam comparecer ao (àquele) evento.
Observação: Bechara (2006, p. 308) defende que a crase é “um fenômeno fonético que se estende a toda fusão de vogais iguais”. Portanto, também há crase nos seguintes exemplos citados pelo autor: “Teu pensamento como_o sol que morre.” “Durante a noite quando_o_orvalho desce.” (p. 632). Todavia, nada ficou combinado sobre a acentuação destas fusões.
5.2 A Análise Sintática e a Crase
Embora seja uma questão fonética, é a partir da análise da sintaxe dos termos das orações que decidimos sobre a adoção ou não da crase em nossa escrita. Para que usemos com acerto a crase, temos sempre que analisar duas questões:
a) temos que verificar a regência do verbo, se ele pede ou não a preposição A, e isto só pode ser feito com a consulta constante a dicionários, ou com a memorização das regências;
b) temos que verificar se o termo que serve de complemento ao verbo pede artigo feminino A ou se se trata do A de Aquela(s), Aqueles, etc.
Somente tal análise sintática nos dará certeza sobre a crase.
Vamos analisar alguns casos para compreender isto.
Caso 1
1. Ele se referia(às) irmãs de Paula.
Digamos que o estudante saiba que o verbo referir-se pede preposição, porém tem dúvida quanto ao uso do artigo no complemento irmãs de Paula. Sendo assim, é possível tirar a dúvida transformando a expressão que serve de complemento do verbo por outra semelhante no masculino: aos irmãos de Paula. Ora, se ocorre no masculino a prep. A, unida ao artigo OS , a fusão também ocorrerá com o feminino: ela se referia A + AS irmãs de Paula. Isto indica a presença da crase na frase.
Digamos que tenhamos dúvida sobre o verbo e a preposição. Vejamos os seguintes casos.
Caso 2
2. A aluna se dirigiu( à) sala de aula e depois se dirigiu (a) casa.
Nestes casos, podemos usar um outro expediente: transformar a suposta preposição A em uma preposição semelhante: PARA. Teremos então: a aluna se dirigiu para a sala: a aluna se dirigiu para casa. Temos então crase no primeiro caso e no segundo não.
No segundo exemplo, não há crase porque a palavra casa, no sentido de lar, domicílio por convenção, não recebe artigo. Todavia, ao determinarmos a palavra casa ela receberá o artigo. Vejamos:
A casa de Deus é sagrada. A casa paterna é calorosa. A casa 31 é azul.
A aluna dirigiu-se à casa paterna…de Deus… à casa 31.
Caso 3
Há casos em que a crase é facultativa porque o complemento verbal não pede obrigatoriamente artigo.
Referiu-se (à) minha irmã e depois referiu-se (à) Paula.
Nestes casos, podemos fazer um teste, colocando o complemento do verbo como sujeito de uma oração, com tal tentativa, poderemos notar se o uso do artigo é facultativo:
Sua irmã é ótima pessoa. A sua irmã é ótima.
Paula é boa pessoa. A Paula é boa.
Ora, se o artigo é facultativo, também a crase é facultativa, sendo que tais expressões, sem a crase, ficam apenas com o A preposicional.
Portanto, a crase é facultativa em dois casos:
a) Antes de nomes femininos, pois em nossa língua estes nomes não exigem obrigatoriamente o artigo, a não ser quando são determinados por uma outra expressão.
(A) Cleonice recebeu uma carta.
Enviamos uma carta /à/ Cleonice .
A (artigo obrigatório) Cleonice da Faculdade (determinação) recebeu uma carta.
Enviamos uma carta à Cleonice da Faculdade.
b) Antes de pronomes possessivos adjetivos femininos singular.
(A) Minha irmã pediu explicações.
Pediram explicações /à/ minha irmã.
Observação: quando o pronome possessivo tem a função de um substantivo, o uso da crase ou é obrigatório ou proibido. Veja:
A minha faculdade é melhor que a tua(=faculdade).
O meu time é melhor que o teu(time).
Esta estátua é semelhante à nossa.(nossa).
Este Rodin é semelhante ao nosso.(Rodin).
Nestes casos, os pronomes estão sendo usados para substituir substantivos( que estão entre parênteses) e não para acompanhar um substantivo dando-lhe uma qualidade, como ocorre em minha irmã.
No primeiro exemplo, o uso da crase é proibido porque não há preposição, apenas ocorre o artigo. Isto fica evidenciado quando transformamos a expressão em outra semelhante no masculino(segundo exemplo).
No terceiro exemplo, é obrigatório o exemplo da preposição e do artigo.
Caso 4
Algumas expressões têm termos elididos, mas mesmo assim ocorre a crase.
-Aquela garota é interessante.
– Qual?
– Refiro-me à (garota)que está de azul.
5.3 Casos Especiais
1. Nomes de localidades. Há os que pedem artigo antes de si e os que não admitem a presença do artigo. Se comprovarmos que o verbo pede preposição, basta testar se o topônimo pede artigo e para isto podemos mudar o verbo da oração por ESTAR ou VIR.
O time foi a Porto Alegre. O time veio de Porto Alegre…estava em Porto Alegre.
Os professores foram à Europa. Os professores vieram de + A Europa. Os professores estavam EM+A Europa.
2. Para saber se há crase com os demonstrativos iniciados em A, basta substituir os mesmos pelos demonstrativos Este, Isto, Esta, se antes deste tivermos preposição, então teremos a crase.
Enviei cartas àquela empresa ( a esta).
A crítica está relacionada àqueles problemas. ( a estes).
A solução era aquela apresentada ontem (esta).
3. Quando a expressão casa significa lar, domicílio e não vem acompanhada de adjetivo ou locução adjetiva não há crase: chegamos a casa cedo. Chegamos à casa paterna tarde.
4. Não há crase quando a palavra terra significa algo oposto a mar, ar, bordo. Todavia, quando terra significa o planeta, lugar onde se nasceu, solo onde se planta, então pede artigo e se houver verbo com preposição haverá crase.
Voltei à terra onde nasci.
Os Ets chegaram à Terra.
Os lavradores se dedicaram à terra durante toda a vida.
Os marinheiros resolveram ir a terra.
5. Não se usa a crase na locução a distância, significando de longe. Ali ocorre apenas a preposição A. Quando tal termo é determinado, então ele pede artigo.
A distância de 65 km é percorrida em poucos minutos e Petrópolis fica à distância de 65 km do Rio.
Ele me olhava a distância.
6. Para sabermos se existe ou não crase diante de um pronome relativo, temos que, em primeiro lugar, encontrar o seu antecedente e, logo após, substituí-lo por um substantivo masculino. Se o A se transformar em AO, evidencia-se a crase; caso isto não ocorra, e o A fique inalterado ou se transforme em O, então não ocorre crase.
A faculdade a que me refiro precisa de professores.
O colégio a que me refiro precisa de professores.
A avenida em que moro é paralela Àque vai dar na praça.
O parque em que moro é paralelo AO que vai dar na praça.
Com isto testamos se o antecedente pede ou não o artigo feminino.
Obs.: o pronome relativo não pode ser substituído por outro semelhante.
7. Não confunda DEVIDO com DADO.
Conforme Houaiss, devido é:
1. “ adjetivo e substantivo masculino – que ou o que é objeto de uma dívida ou de uma obrigação. Exs.: recebeu-a com a d. consideração, mandou pagar o d. “
2. substantivo masculino – que ou o que é merecido, justo, o que cabe a cada indivíduo por direito ou dever.”
3. (Houaiss, ver verbete)
Portanto devido pede a preposição, assim há crase em frases como : “devido à bagunça dos vizinhos, não dormi” (devido AO barulho).
Já dado , significando “habituado ou propenso a.
Exs.: d. ao estudo; d. à bebida”, podemos ter sucesso ou não. Neste caso, devido é um adjetivo que pede a preposição A.
Todavia, dado pode ser também o particípio de dar, significando algo que já foi exposto, revelado.
Ex.: dada a questão primordial, dado o problema (com base em tal questão já exposta) envolvendo tais fatos, chegamos à conclusão que não iremos negociar.
5.4 Casos em que crase é obrigatória
1. Locuções prepositivas, adverbiais e conjuntivas (desde que, no último caos, tenham um substantivo feminino como núcleo).
À moda de, às vezes, à queima-roupa, , às escuras, à noite, à custa de, às pressas, à tarde, à medida que, à força.
2. Em locuções adverbiais que indiquem hora determinada.
Às treze horas em ponto.
3. Quando as expressões “rua”, “loja” estiverem subentendidas.
Vá à Casas Bahia, vá à (loja) Lojas Americanas, Dirija-se à Marquês de São Vicente, n º 155.
Nos dois primeiros exemplos, a questão é polêmica, mas se advogarmos que há o termo loja elidido, então os exemplos estão corretos.
5.5 Casos em que não ocorre crase
1. Antes de palavra masculina ( o A é apenas preposição): Vieram a pé, vende-se a prazo; chegou a tempo.
2. Antes de verbo (o a é apenas preposição): Ela começou a admirá-los; ela começou a passar mal.
3. Antes de expressão de tratamento (o A é apenas preposição) : Agradeço a Vossa Senhoria ; ofereceram rosas a você.
4. Antes de pronomes demonstrativos esta ,essa. ( o A é apenas preposição): Não me refiro a esta solicitação; A essa menina não devo nada.
5. Antes de pronomes pessoais ( o A é apenas preposição): Dirigiu-se a mim com respeito e a ela com gratidão.
6. Antes de pronomes indefinidos ( o A é apenas preposição): ela diz isso a qualquer um; a entrada é vedada a toda pessoa estranha, a toda a Bahia ele deve dinheiro.
7. Quando o A estiver no singular e a palavra seguinte estiver no plural (( o A é apenas preposição): refiro-me a pessoas curiosas, falei a mulheres sobre mulheres.
8. Quando antes do A já existir uma preposição (o A é apenas artigo): os papéis estão sob a mesa; ela falou aquilo perante a coordenação.
Observação: Martins e Zilberknop observam que ATÉ A pode ser craseado por motivo de clareza, fugindo à regra acima. Vejamos os exemplos:
A água inundou a rua até à casa de Maria.
A água inundou a rua até a casa de Maria.
No primeiro caso, significa que a água quase chegou à casa de Maria, no segundo, significa que a água inundou inclusive a casa de Maria.
Quando ATÉ significa “perto de” “limite”, ATé é uma preposição que admite uma outra preposição para auxiliá-la é o caso do primeiro exemplo.
Quando até significa “inclusive” , é um advérbio e o A é uma partícula de inclusão.
Veja, para confirmar, em Houaiss o verbete ATÉ:
“Preposição
1 expressa um limite posterior de tempo. Ex.: ficará a. maio
2 expressa um limite espacial, o término de uma distância ou de uma superfície Exs.: trace uma linha a. o canto. venha a. aqui.”
Advérbio
3 também, inclusive, mesmo, ainda. Ex.: come a. carne crua .
4 no máximo. Ex.: ponha a. cinco folhas para ferver .
“a) como prep., é indiferentemente correto associá-la ou não a outra preposição (ir a. o parque ou ir a. ao parque; caminhar a. a igreja ou a. à igreja), embora, por vezes, se imponha tal escolha para evitar a ambiguidade: em frases do tipo estudei a. a quinta lição e percorremos até o campo, em que tanto se poderia entender ‘até mesmo a lição ou o campo’ ou ‘até o limite da lição ou do campo’; atualmente, as utilizações oscilam; b) como prep. us. com pron. pessoal oblíquo tônico (ela chegou a. mim e me abraçou); como adv. us. com pron. pessoal reto (a. eu paguei o imposto); c) como prep. o lugar dele é fixo, antes do nome ou sintagma nominal a que se refere; como adv., sua posição pode variar na frase: saiu numa escola de samba, a.” (Houaiss, ver verbete).
5.6 Exercício. Nas orações abaixo, coloque crase, se necessário.
1. Antes de ir ao teatro, a mãe sempre agradava a filha passando a mão nos cabelos.
2. As declarações do ministro não agradaram a bancada do governo.
3. Ela aspirou a fragrância do alecrim.
4. O menino aspirava a carreia de piloto.
5. O médico assistiu a moça doente.
6. Quando ela telefonou, estávamos assistindo a peça.
7. O Ministro da Educação atendeu a reinvindicação que constava no processo pelos docentes.
8. As recepcionistas atendiam as convidadas com carinho.
9. Garçom! Quero a tulipa bem cheia.
10. Queria-lhe mais que a própria vida!
11. Custa muito as pessoas ficarem quietas.
12. Esta portaria do governo implicará a reavaliação dos nossos gastos.
13. O menino desobedeceu a mãe, mas a mãe obedeceu a lei.
14. Prefiro a morte a vida de solteiro.
15. Pisei a grama
16. Pisei a ponta do pé dela.
17. Abraçou-se com o pai, chorou; abraçou a irmã e foi embora.
18. Ela lembrou as férias com saudade.
19. Após presidir a sessão, o desembargador presidiu uma mesa redonda.
20. Avisei a turma que iria chegar tarde.
21. Ensinei-o a dança do ventre.
22. Agradeci a equipe a vitória.
23. Comunicou a decisão a outro, mas não a mim.
24. Comunicou a amiga a cerimônia de casamento.
25. Pagamos a empresa a conta devida.
26. Jesus perdoou a traição , perdoou a Madalena.
27. Autorizou a professora a dispensar os alunos.
28. Convidei-o a ficar no local
5.6 Exercício. Nas orações abaixo, coloque crase, se necessário. (Respostas)
1. Antes de ir ao teatro, a mãe sempre agradava a filha passando a mão nos cabelos.
No sentido de acarinhar pede OD.
2. As declarações do ministro não agradaram a bancada do governo.
Agradável pede A
3. Ela aspirou a fragrância do alecrim.
Respirar pede OD
4. O menino aspirava a carreia de piloto.
No sentido de pretender, pede A
5. O médico assistiu a moça doente.
Pede OD ou OI
6. Quando ela telefonou, estávamos assistindo a peça.
Ver pede A
7. O Ministro da educação atendeu a reinvidicação que constava no processo . pelos docentes.
Deferir pede OD, mas no sentido de dar atenção pede LHE.
8. As recepcionista atendiam as convidadas com carinho.
Atenção com pessoas pede OI ou OD.
9. Garçon! Quero a tulipa bem cheia.
Desejar pede OD
10. Queria-lhe mais que a própria vida!
Estimar pede A
11. Custa muito as pessoas ficarem quietas.
Ser difícil pede A
12. Esta portaria do governo implicará a reavaliação dos nossos gastos.
Trazer como consequência pede A, não pede Em
13. O menino desobedeceu a mãe, mas a mãe obedeceu a lei.
Pede A
14. Prefiro a morte a vida de solteiro.
À vida. Incorreto: do que a vida…
15. Pisei a grama
Pede OD e não NA
16. Pisei a ponta do pé dela.
Idem
17. Abraçou-se com o pai, chorou; abraçou a irmã e foi embora.
Quando pronominal, pede COM, Pede OD ou OI , crase facultativa.
18. Ela lembrou as férias com saudade.
Correto ou DAS férias.
19. Após presidir a sessão, o desembargador presidiu uma mesa redonda.
Pede OD ou OI, crase facultativa.
20. Avisei a turma que iria chegar tarde.
Pede OD OI.
21. Ensinei-o a dança do ventre.
Correto, mas pode ser com LHE.
22. Agradeci a equipe a vitória.
Agradecer a alguém alguma coisa.
23. Comunicou a decisão a outro, mas não amim.
Pronome indefinido e pron. Pessoal não pedem artigo.
24. Comunicou a amiga a cerimônia de casamento.
Comunicar algo a alguém.
25. Pagamos a empresa a conta devida.
Pagamos alguma coisa a alguém.
26. Jesus perdoou a traição , perdoou a Madalena.
Perdoar pede OD ou OI. Para pessoa e OD para coisa.
27. Autorizou a professora a dispensar os alunos.
Autorizar alguém a fazer algo.
28. Convidei-o a ficar no local
Convidar alguém a algo.
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