No texto de hoje analisaremos a última proposta de redação de um dos vestibulares mais concorridos do Brasil, o da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquista Filho” (Unesp). Como dissemos na publicação do dia 08 de janeiro , fazer as propostas de redação dos principais vestibulares do país é uma estratégia mais do que acertada nos estudos para o Enem, já que a maioria dos exames requer uma dissertação-argumentativa, assim como o Enem.
O vestibular da Unesp é realizado pela Vunesp (Fundação para o Vestibular da Universidade Estadual Paulista) e tem como característica abordar temas das mais variadas linhas, desde as de cunho social até as pessoais e filosóficas. No vestibular 2015, em sua primeira fase que foi realizada no dia quinze de dezembro de 2014, o tema da proposta de redação foi “O legado da escravidão e o preconceito contra negros no Brasil”1, que surpreendeu os candidatos, já que a Unesp é uma verdadeira caixinha de surpresas em termos de temas de propostas de redação. Apesar desta aparência tranquilidade, ressaltamos que o tema não é relacionado à escravidão passada, mas sim ao seu legado, às suas consequências, como o racismo, que, infelizmente, perduram até hoje no Brasil.
Desse modo, de antemão, o candidato deveria ter abordado as consequências atuais da escravidão (racismo) no Brasil e não no mundo todo ou em outro país. Dissertar sobre a história da escravidão, por exemplo, e não chegar ao seu legado atual é tangenciar o tema.
A proposta de redação, na íntegra, é a seguinte:
O primeiro texto da coletânea afirma que a Lei Áurea, assinada em 1888, não garantiu a integral liberdade dos ex-escravos, o que é uma verdade. O candidato que estudou bem História, ao ler este texto de Emília Viotti da Costa, deveria ter relacionado estas afirmações com os fatos de que muitos negros, após a abolição, continuaram trabalhando nos mesmos lugares, pois não tinham para onde ir e os que foram embora das fazendas e das casas nas quais trabalhavam foram morar nas periferias das cidades; primeiramente, nos cortiços e, após uma limpeza urbana como ocorreu no Rio de Janeiro, nos morros. A novela Lado a Lado, da rede Globo, exibida entre os anos 2012 e 2013 mostrou muito bem este período histórico e foi uma bela aula de História.
Assim iniciou-se mais uma fase da vida da população negra à margem, literalmente, do restante da sociedade, ou seja, nas periferias e nos morros das cidades, isolados, afastados e sem nenhuma condição de qualidade de vida, o que ainda acontece nas favelas e comunidades por todo o país, infelizmente.
O segundo texto da coletânea, de autoria de Ali Kamel, de um modo é uma continuidade do primeiro texto, pois retrata a condição do negro no mercado de trabalho, mais especificamente em grandes empresas, e constata a pouca mão de obra negra e relaciona este fato não à cor da pele, mas sim à pobreza e à má distribuição da renda da qual a população negra é vítima desde a abolição da escravidão.
O candidato poderia, em sua redação, adicionar a isto o fato de que os trabalhadores negros ganham menos do que os branco inclusive quando ocupam os mesmos cargos e estes fatos estão conectados ao fato de que poucos estudantes negros conseguem adentrar nas universidades públicas e particulares do Brasil e, para tratar este problemas, as cotas foram criadas como medidas afirmativas. Porém, ressaltamos que a proposta de redação não trata das cotas raciais, mas elas podem ser trazidas pelos candidatos como estratégias argumentativas.
O terceiro texto da coletânea textual, por sua vez, contesta a afirmação ilusória de que, no Brasil, não há preconceito racial. Basta conversarmos com uma pessoa negra para verificarmos que isto é, realmente, uma mentira. A todo o momento temos provas disso, desde piadas racistas até publicidades e programas de televisão com cunho preconceituoso, como foi o caso de Sexo e as Nega da rede Globo, contrariando Lado a Lado. Nesta série, as mulheres negras são retratadas como objetos sexuais, nada mais e isto gerou inúmeras discussões, principalmente nas redes sociais, fato que pode ter sido colocado, pelos candidatos, como um legado da escravidão no Brasil.
O quarto e último texto da coletânea textual é uma continuação do terceiro e questiona, novamente, a inexistência do racismo no nosso país. Ninguém é racista, mas conhece um.
Os casos de racismo no futebol brasileiro que ocorreram em 2014 são um legado da escravidão brasileira. A torcedora do Grêmio que chamou de “macaco” o goleiro Aranha, do Santos, argumentou que tem amigos negros e que já saiu com homens negros, mas isso não justifica ela ter enchido a boca para ofender o jogador oponente.
O caso do casal de namorados – ela negra e ele branco – que postou uma foto juntos em uma rede social e foi alvo de preconceitos é um legado da escravidão no Brasil. E ainda há quem diga que não há racismo por aqui…
Portanto, o tema da proposta de redação da Unesp 2015 é pertinente, atual e importante e poderia muito bem ser uma proposta de redação do Enem com a adição da exigência de uma proposta de intervenção social que objetivasse eliminar, de fato e de vez, o racismo no Brasil.
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22 de janeiro de 2015
Análise de Tema da Redação UNESP 2015
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