Escrever uma proposta de dissertação-argumentativa de outro exame que não seja o Enem é uma estratégia de estudo, já que o tipo textual requerido é o mesmo. Além disso, fazendo outras propostas de redação, o estudante toma conhecimento e mantém contato com os mais variados temas possíveis.
Obviamente, o candidato ao fazer propostas de redação de outros vestibulares deve lembrar-se das características das provas de produção textual do Enem que, nem sempre, são as mesmas dos demais exames. Temas de viés social, situados no contexto brasileiro e que pedem uma proposta de intervenção social são as maiores marcas das propostas de redação do Enem as quais o estudante deve ter sempre em mente.
Portanto, objetivando ampliar a diversidade de temas e os métodos de estudo dos nossos leitores daremos início, neste ano, a mais uma série de publicações na coluna sobre redação no Enem que analisará propostas de redação de outros vestibulares.
Daremos início com a análise da proposta de redação realizada pela Fuvest para o vestibular 2015 da USP, cuja prova de produção textual foi aplicada juntamente a de Língua Portuguesa e Literatura no último domingo, dia 04 de janeiro.
A seguir, a proposta de redação na íntegra1:
O tema da proposta de redação do vestibular 2015 da USP chamou muito a atenção não só dos candidatos, mas também da mídia, já que traz em sua frase de comando um neologismo: “camarotização”. Este termo é derivado da palavra “camarote” que designa uma área separada, normalmente fechada, das demais áreas de um lugar, como um teatro ou uma boate, por exemplo. Sabe-se que o camarote é a área mais cara de um lugar no qual os frequentadores ficam mais confortáveis e têm mais privacidade, além de obterem mordomias como comidas e bebidas, tudo incluso em um alto preço.
A “camarotização” é algo bem comum e corriqueiro em nosso dia a dia. Ao compramos ingressos para um show, para uma peça de teatro, para um jogo de futebol ou qualquer outro evento nos deparamos com opções mais caras (áreas VIP2 e camarotes) e outras mais baratas. É como comprar passagens aéreas: há a opção da primeira classe, da classe executiva e da econômica, com assentos mais apertados e até onde a comida é cobrada a parte por algumas empresas.
Porém, nunca ou pouco pensamos que este fenômeno segrega as pessoas, já que elas próprias separam-se das outras ao ficarem em uma área VIP ou em um camarote. Em um teatro, por exemplo, há assentos melhores para se assistir à peça, mas eles são mais caros do que os demais e assim, por meio do dinheiro, as pessoas compram lugares melhores e o direito de ver a peça de um melhor ângulo.
É o caso, só que em um estádio de futebol, exemplificado pelo primeiro texto da coletânea. Antigamente, pessoas de diferentes classes sociais compartilhavam do mesmo espaço e dos mesmos problemas, como a chuva, por exemplo, ao irem assistir um jogo de futebol do seu time. Hoje, porém, a arquibancada geral é o local das torcidas organizadas, das pessoas mais humildes e os camarotes são destinados aos mais abastados.
O segundo texto já relaciona este fenômeno ao dia a dia ao afirmar, com toda a razão, que há separação e diferenças entre as classes sociais em setores como transporte público, educação e saúde, já que há a impressão de que os serviços públicos são destinados à camada mais pobre da população. Obviamente que há a questão do sucateamento destes serviços; o ideal é que todos usufruíssem das escolas públicas, do transporte público e dos hospitais públicos por sua qualidade.
Ao citar os shoppings, o autor nos faz lembrar de outro fenômeno, o dos rolezinhos, já que estes eram realizados nos shoppings com o intuito de promover uma inclusão social e mercadológica e muitos empresários reagiram expulsando e selecionando as pessoas que queriam entrar nas dependências de seus centros de comércio.
O terceiro texto da coletânea, por sua vez, amplia a reflexão do segundo texto e projeta um futuro no qual haverá esta segregação até nos supermercados, já que as classes populares estão usufruindo mais de espaços antes dominados pelas classes mais abastadas, como os aeroportos, por exemplo. Esta citação noa faz lembrar do caso de um homem que estava usando bermuda e regata na sala de espera de um aeroporto brasileiro e que foi ridicularizado nas redes sociais por uma professora universitária que o fotografou e que publicou a foto a fim de denegrir sua imagem devido a sua vestimenta.
Por fim, o quarto e último texto da coletânea faz um contraponto relatando como era antigamente, quando nas escolas públicas todos conviviam e tinham as mesmas experiências.
Apesar de vivermos em uma democracia, a segregação social é algo comum que ocorre sem que percebamos; por vezes, nós próprios nos separamos ao não irmos em determinado bairro, ao comprarmos um lugar na área VIP de um show ou em um camarote em uma balada a fim de ter mais privilégios individuais. Por meio da segregação espacial a sociedade brasileira cria sortilégios. Em decorrência dos rolezinhos, do Rei do Camarote e das remoções impostas pelas obras da Copa do Mundo, o tema é pertinente.
O mais interessante desta proposta é ela vir de onde veio: da USP. Só neste último ano, a porcentagem de candidatos oriundos das escolas públicas, no vestibular da Fuvest, caiu para 32%. O vestibular mais elitista do país, assim, pode ser considerado um camarote universitário no qual poucos têm a chance de adentrar, apesar de ter aberto este espaço a uma reflexão tão importante.
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9 de janeiro de 2015
Proposta de redação e comentário da FUVEST - OFICIAL
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